O Mar: metáfora da vida

Mar que és a minha estrada mais segura para passar além da dor, entre perigos e abismos, desembarcando em ilhas misteriosas de noites puras, que lavam a minha alma.

Liberto-me assim das humanas quimeras, de vãos anseios e navego numa esperança em movimento, sobre águas translúcidas.

Solto as amarras dos sonhos que são lançados ao azul do mar, caminhando por ondas entreabertas e buscando respostas às perguntas urgentes. Quero assim inventar a alegria de que o mundo carece e multiplicar a empatia que tende a desaparecer, descobrindo manhãs claras na luz impura e no mar cinza.

Quero sentir o silêncio no bater das ondas, sem perturbar a paz que me foi dada pelas ninfas do mar.

Mas mesmo em dias de tempestade, em que soltas espuma branca de revolta, a tua beleza cativa e o teu inconformismo comove.

E se o tempo não tiver fim, nesse instante de eternidade em que o céu e o mar se encontram, ouvirei num búzio a canção do mar, salpicada de sal e de pólen de luz, guardando, feito tesouro escondido, o sonho que ainda tenho de um dia ser sereia!!!

(Manuela Resendes)

Pureza…

Sinto saudades da pureza do lugar onde nasci, onde as coisas eram simples, belas e descontaminadas.

Lembro os olhares inocentes, os lugares misteriosos e a descoberta de insignificâncias que provocavam emoções fecundas.

Saudades da música das festas, do aroma das candeias e dos amigos que ficaram lá.

Olhos que me seguiam, com as mãos postas no regaço carregadas de doçura, tecendo dias sem memória.

O sol cegava as palavras que deixavam cair um silêncio para se poder ouvir o passar do vento, o azul da chuva e o feitiço do mar.

O despertar com a luz a atravessar a nudez dos vidros e com o canto dos pássaros a anunciarem a alvorada.

As tardes que surgiam de mansinho, dando lugar a céus estrelados que tornavam todos os sonhos possíveis.

Era um tempo em que corríamos mais rápido do que a vida e hoje não a conseguimos apanhar…

(Manuela Resendes)

E chegou 2023…

Despertei com o sol a entrar pela janela, com uma luz clara que acendeu a chama da esperança.

Acabaram as festas e a obrigatoriedade de uma alegria ( mesmo que plástica), de efusivas comemorações e fogos de artifício.

Hoje nada começa, apenas continua a fluir, mas a passagem que para muitos é de inebriamento e “gritos de alegria”, para mim é mais de reflexão sobre onde estou e para onde quero ir.

Defino alguns objetivos que pretendo cumprir, analiso onde poderia ter feito melhor e dou espaço para que a vida me surpreenda, com a sua essência de incerteza envolta em mistério.

Mas o ano que passou não fica lá atrás, temos o mesmo céu e o mesmo chão, as mesmas pessoas e os mesmos problemas, podendo apenas mudar o nosso olhar sobre as questões com que nos deparamos. Porque a vida é um ciclo contínuo e ininterrupto e o “milagre” da mudança não se faz apenas de promessas ou desejos, ou na conjuntura dos astros à meia noite do dia 31 de dezembro.

A mudança faz-se se conseguirmos ancorar o nosso mundo na esperança, luta e capacidade de sonhar.

Que assim seja em 2023!

(Manuela Resendes)

Novo Ano

Com o aproximar do Ano Novo são muitos os balanços que se fazem e os propósitos de mudança que se enumeram.

Mas este é um assunto demasiado importante, que nāo pode ficar apenas nas boas intenções.

Sinto uma turbulência no mundo, geradora de muita violência, revolta e frustrações.

A mudança é necessária, a coragem para os recomeços é urgente e a educação para a alegria é imperiosa.

Os dias estão pesados e escuros, mas temos de reaprender a leveza de andar sobre a água e sobre o vento, descobrindo limiares de luz.

Temos de reaprender a não banalizar o que é realmente importante, evitar os gestos mecânicos e repetitivos, acolhendo a surpresa e mantendo a esperança na tarefa, sempre inacabada, de contribuir para um mundo melhor.

Temos de manter o pensamento livre e insubmisso, não absorvendo a avalanche de informação com que todos os dias somos bombardeados.

Temos de educar as nossas crianças para a solidariedade e não para a competitividade, para o ser e não para o ter, para a felicidade e não para o sucesso, incentivando o pensamento crítico e argumentativo.

Sonho com a mudança de paradigma do mundo, talvez inalcançável, ou mesmo utópica, mas vou fazendo o meu caminho confiante de que pequenos passos poderão frutificar e serem propulsores de algo maior.

Que 2023 seja um terreno fértil onde as boas sementes possam germinar!!!

(Manuela Resendes)

A Voracidade do Tempo

O tempo, essa entidade abstrata e invisível, mas que regula o nosso quotidiano, corre veloz por caminhos ingremes ou planos, sem olhar para trás, rumo ao que será!

Assim, vamos marcando o ritmo por acontecimentos marcantes como o Natal e o Ano novo, os aniversários e as férias, que são paragens para desacelerar da vertiginosa corrida do dia a dia.

Não prestamos atenção ao trevo que desponta da terra, à tarde que lentamente se transforma em noite ou às ondas que se quebram nas rochas.

Não prestamos atenção a quem precisa de uma palavra, de um sorriso, ou mesmo de um naco de pão.

Não prestamos atenção ao sem abrigo que nos implora por alguma forma de ajuda, porque seguir indiferente é mais fácil.

Deixamos para o Natal as dádivas de esperança e o amor como legado, como se esses não fossem presentes de todos os dias.

E só em dias especiais, partilhamos as auroras resplandecentes de luz, como se essa poupança fosse um ganho e não uma perda.

Vamos tentar alcançar o horizonte com o nosso vasto olhar e não ficarmos indiferentes ao que vemos.

Teremos assim a possibilidade de criar boas memórias para gerações vindouras, porque só o tempo da memória pode parar e perdurar até tempos longínquos, em que instantes se eternizam.

Mas o tempo é finito, e mesmo olhando para trás ele segue em frente!

Festas Felizes

(Manuela Resendes)

Festas Felizes

Abro a janela branca do tempo e percebo que estamos em vésperas de Natal…

Os sons dos outros lá fora não me soam melodiosos e desfaço-me deles. Exploro outros ecos, mais solitários, mas que me permitem sonhar com céus brilhantes.

Procuro no amor e na inspiração que os outros me aportam o sentido para este momento.

Vou dando à luz acordes da memória e a falta, mais do que a ausência, rasga a cortina e entra casa dentro, transportando consigo o futuro.

Percorro os caminhos da minha alma e tranco a porta a toda a maldade, fixando o meu olhar na beleza indescritível de um encontro, de uma palavra ou de um ato solidário.

Quero que o meu Natal exista para além das luzes e das prendas, do presépio e das iguarias, constituindo também um tempo de espiritualidade.

Estendo assim a passadeira, para dar os passos que poderão fazer de mim uma pessoa melhor.

Porque se queremos mudança esta terá de começar em nós….

Festas Felizes….com sentido!!!

(Manuela Resendes)

Espírito Natalício

Todos nós queremos sentirmo-nos imbuídos do espírito natalício…

Procuramos essas sensações no vento e na chuva, no céu e no mar, na música alusiva ao tema que toca sem parar.

Apesar dos silêncios infinitos com sabor a nostalgia, somos levados pela agitação da cidade, pelo reboliço em espaços comerciais e o ruído das crianças com os bolsos carregados de sonhos.

Queremos acreditar que seres alados nos vão trazer a paz que o mundo não carrega, a justiça que tarda em chegar e o antídoto para o sofrimento de tantos inocentes.

Damos agora mais atenção aos pobres e indigentes, como quem quer limpar a consciência, para melhor saborear os belos repastos e consumismos exagerados.

Decoramos a casa a preceito, com luzes coloridas e céus estrelados, para esquecer as trevas de outros dias.

Acendemos a lareira que nos aquece até o coração, e o crepitar da lenha transporta-nos para as emoções da nossa antiga idade, que agora só encontramos nos rostos das crianças.

Fico a pensar em que estrada, em que cidade, em que país, perdi a magia de que se fazia o Natal da minha infância.

Talvez o tempo me venha a saber responder…

(Manuela Resendes)

Um sopro de vento…

Olho o céu e fascina-me o movimento das nuvens que seguem apressadas, atravessando, indiferentes aos problemas do mundo, a luz discreta das tardes de outono.

As folhas dançam de forma elegante e harmoniosa, com coreografias feitas no ar ou no chão, num movimento interminável.

O sopro de vento vai descendo montanhas e, atravessando vales, abre brechas em algumas barreiras onde ficaram presos um punhado de sonhos, ampliando assim o meu espanto.

E porque a arte de iluminar a vida em situações de maior opacidade nos permite enxergar o futuro com tons mais coloridos, vamos retirar os automatismos do nosso quotidiano para que possamos ser todos os dias viajantes desta aventura que é a vida.

Vamos seguir como o vento, leves, livres e felizes!!!

(Manuela Resendes)

A insensatez do mundo…

Que mundo é este, em que a humanidade se alimenta de insensatez, em que predominam interesses individuais e há uma impotência da razão?

Que mundo é este, em que a bondade anda por caminhos desviados, atalhos sufocados e sem norte para repousar?

Que mundo triste é este, em que sentimos passar brisas de insensatez em cada fresta, em cada brecha e em cada sulco?

Que mundo é este, onde a bruma onde me movo está prenhe de cansaços, enganos e caminhos com pedras fora do chão?

Que mundo é este, onde tantos mastigam o silêncio na mais profunda solidão, sem que ninguém lhe dê a mão?

Que mundo é este, onde todos os dias acontecem derrocadas, onde me apresso a juntar os pedaços, para não assistir ao desmoronar?

Mas para aliviar toda a escuridão do meu coração, uma estrela brilhará para me mostrar que em todos os desertos existe um oásis…

(Manuela Resendes)

Lançamento do “Anatomia do Quotidiano” em Ponta Delgada

Na última sexta-feira, dia 14 de outubro, o meu livro “Anatomia do Quotidiano” foi lançado em Ponta Delgada, numa sessão que decorreu na Biblioteca Pública e Arquivo de Ponta Delgada. Na sessão intervieram a Prof.ª Ana Teresa Alves, que apresentou o livro, e a diretora da Biblioteca, Dr.ª Iva Matos.

Agradeço a todos aqueles que comigo quiseram partilhar um momento que recordarei para sempre.

Bem hajam!

(Manuela Resendes)

(fotografias de Luís Ferreira)