Manhãs Azuis

Fico deslumbrada com os azuis de uma manhã de primavera, onde ecoa a voz sábia dos pássaros que regressam de destinos distantes com novas melodias.

Invade-me uma sensação de paz que me cura do cansaço de dias de tempestade e me deixa imersa numa felicidade inocente.

A alma transborda de mar e o olhar transporta o brilho do sol, afastando assim nevoeiros que por vezes se instalam como véus de penumbra.

E assim vai correndo a vida entre vazios e plenitudes, entre a realidade e os sonhos, com presença e com saudade, nesta busca constante de alcançar o quase impossível.

E vou fazendo este caminho com pés alados sob a areia morna de praias desertas, rumo a destinos desconhecidos onde a novidade provoque um olhar de espanto.

Quero permitir-me viver intensamente todas as idades, inspirada no exemplo das árvores, e sempre reconhecida a quem me ensina a superar o medo quando este me invade.

E sigo confiante rumo ao futuro!!!

(Manuela Resendes)

Dia da Liberdade

A liberdade que hoje nos habita

Emergiu do escuro e do medo

De poemas com mensagem inaudita

Do sobressalto vivido em segredo

Da aurora de luz, nascida de noite escura

Águas claras brotaram

Em rostos curtidos do sol

De vozes que o silêncio calaram

Foram lançadas as sementes

No olhar de cada criança

Soltaram-se as correntes

E germinaram as mudanças

Num abril novo, numa outra primavera

E quando abril nos falta

Temos de acender a candeia

E protegê-la do vento que passa.

(Manuela Resendes)

Estará o mundo louco?

Todos os dias me deparo com notícias que me deixam triste, desiludida e preocupada.

Sinto que o mundo está a ruir da base até ao topo, deparo-me com uma realidade instável, enganosa e hipócrita.

Estamos confusos, com a alma enganada, num movimento perpétuo que não leva a lado nenhum.

Precisamos de nos reinventar, criar novos modelos de vida e de felicidade, mais focado nas pessoas, valorizar o conhecimento e a imaginação e colocar a ética como pilar das nossas relações pessoais e profissionais.

Mas por vezes, o que nos parece ser o fim é o recomeço de algo maior. Vamos almejar um despojamento mais amplo, valorizar as coisas belas e simples e ampliar as emoções mais fecundas.

Procurar o caminho familiar da saudade de um cheiro, de um recanto ou de um poema, que nos vai ajudar a recentrar, utilizando essa energia e essa luz.

Vamos contemplar as estrelas, as marés, e dos ventos da vida colher sempre o melhor, sabendo que a angústia mora ao lado da felicidade.

Procurar o silêncio em fundo branco, no vazio mais pleno, que aos poucos vamos colorindo com palavras, donde nasce o poema num tempo de absoluta depuração.

Olho-me de novo de forma mais atenta e no reflexo do meu olhar já vejo esperança!

(Manuela Resendes)

Ausências

Olho o horizonte desfocado, raso de nevoeiro, sem que a ausência embacie o meu olhar, enquanto do ventre da madrugada brota uma maré cheia de sonhos e promessas.

Traçam-se assim novos roteiros, que vão rasgando o véu que cobre nuvens escuras, deixando irromper azuis com aroma de futuro.

E nesta tarde que se arrasta lenta, o sol ilumina os alçapões da memória, numa solidão acolhida entre o desamparo e a fé.

Volto agora a olhar o horizonte, que se enche de velas de uma regata, real ou imaginária, mas que se apresenta repleta de sinais.

Afinal existe presença, basta ler os sinais…

(Manuela Resendes)

As sombras da luz

Atravesso a luz que tece sombras silenciosas, alcançando assim o meu limbo de paz. E porque a vida nos cobra todos os segundos, vou juntando pedaços de sonhos que foram atirados janela fora e, assim, vou-me regenerando.

E quando a vida me rouba a minha capacidade de ver o lado bom das coisas escuto a voz do universo, e encontro inesperados mestres.

Tento então tocar a alma de quem vive desamparado, sem o calor de um abraço ou um sorriso capaz de iluminar dias escuros, numa dádiva pontuada de desprendimento.

Mas não podemos esquecer que a nossa maior força é acreditar em nós próprios, descobrir quem somos, inspirarmo-nos e sermos inspiradores pela nossa singularidade.

Citando Francisco Dolto “quando um qualquer ser humano sente um desejo suficientemente forte para assumir todos os riscos do seu próprio ser é porque está pronto para honrar toda a vida de que é portador”.

Que saibamos sempre cumprir a vida…

(Manuela Resendes)

O Mar: metáfora da vida

Mar que és a minha estrada mais segura para passar além da dor, entre perigos e abismos, desembarcando em ilhas misteriosas de noites puras, que lavam a minha alma.

Liberto-me assim das humanas quimeras, de vãos anseios e navego numa esperança em movimento, sobre águas translúcidas.

Solto as amarras dos sonhos que são lançados ao azul do mar, caminhando por ondas entreabertas e buscando respostas às perguntas urgentes. Quero assim inventar a alegria de que o mundo carece e multiplicar a empatia que tende a desaparecer, descobrindo manhãs claras na luz impura e no mar cinza.

Quero sentir o silêncio no bater das ondas, sem perturbar a paz que me foi dada pelas ninfas do mar.

Mas mesmo em dias de tempestade, em que soltas espuma branca de revolta, a tua beleza cativa e o teu inconformismo comove.

E se o tempo não tiver fim, nesse instante de eternidade em que o céu e o mar se encontram, ouvirei num búzio a canção do mar, salpicada de sal e de pólen de luz, guardando, feito tesouro escondido, o sonho que ainda tenho de um dia ser sereia!!!

(Manuela Resendes)

Pureza…

Sinto saudades da pureza do lugar onde nasci, onde as coisas eram simples, belas e descontaminadas.

Lembro os olhares inocentes, os lugares misteriosos e a descoberta de insignificâncias que provocavam emoções fecundas.

Saudades da música das festas, do aroma das candeias e dos amigos que ficaram lá.

Olhos que me seguiam, com as mãos postas no regaço carregadas de doçura, tecendo dias sem memória.

O sol cegava as palavras que deixavam cair um silêncio para se poder ouvir o passar do vento, o azul da chuva e o feitiço do mar.

O despertar com a luz a atravessar a nudez dos vidros e com o canto dos pássaros a anunciarem a alvorada.

As tardes que surgiam de mansinho, dando lugar a céus estrelados que tornavam todos os sonhos possíveis.

Era um tempo em que corríamos mais rápido do que a vida e hoje não a conseguimos apanhar…

(Manuela Resendes)

E chegou 2023…

Despertei com o sol a entrar pela janela, com uma luz clara que acendeu a chama da esperança.

Acabaram as festas e a obrigatoriedade de uma alegria ( mesmo que plástica), de efusivas comemorações e fogos de artifício.

Hoje nada começa, apenas continua a fluir, mas a passagem que para muitos é de inebriamento e “gritos de alegria”, para mim é mais de reflexão sobre onde estou e para onde quero ir.

Defino alguns objetivos que pretendo cumprir, analiso onde poderia ter feito melhor e dou espaço para que a vida me surpreenda, com a sua essência de incerteza envolta em mistério.

Mas o ano que passou não fica lá atrás, temos o mesmo céu e o mesmo chão, as mesmas pessoas e os mesmos problemas, podendo apenas mudar o nosso olhar sobre as questões com que nos deparamos. Porque a vida é um ciclo contínuo e ininterrupto e o “milagre” da mudança não se faz apenas de promessas ou desejos, ou na conjuntura dos astros à meia noite do dia 31 de dezembro.

A mudança faz-se se conseguirmos ancorar o nosso mundo na esperança, luta e capacidade de sonhar.

Que assim seja em 2023!

(Manuela Resendes)

Novo Ano

Com o aproximar do Ano Novo são muitos os balanços que se fazem e os propósitos de mudança que se enumeram.

Mas este é um assunto demasiado importante, que nāo pode ficar apenas nas boas intenções.

Sinto uma turbulência no mundo, geradora de muita violência, revolta e frustrações.

A mudança é necessária, a coragem para os recomeços é urgente e a educação para a alegria é imperiosa.

Os dias estão pesados e escuros, mas temos de reaprender a leveza de andar sobre a água e sobre o vento, descobrindo limiares de luz.

Temos de reaprender a não banalizar o que é realmente importante, evitar os gestos mecânicos e repetitivos, acolhendo a surpresa e mantendo a esperança na tarefa, sempre inacabada, de contribuir para um mundo melhor.

Temos de manter o pensamento livre e insubmisso, não absorvendo a avalanche de informação com que todos os dias somos bombardeados.

Temos de educar as nossas crianças para a solidariedade e não para a competitividade, para o ser e não para o ter, para a felicidade e não para o sucesso, incentivando o pensamento crítico e argumentativo.

Sonho com a mudança de paradigma do mundo, talvez inalcançável, ou mesmo utópica, mas vou fazendo o meu caminho confiante de que pequenos passos poderão frutificar e serem propulsores de algo maior.

Que 2023 seja um terreno fértil onde as boas sementes possam germinar!!!

(Manuela Resendes)

A Voracidade do Tempo

O tempo, essa entidade abstrata e invisível, mas que regula o nosso quotidiano, corre veloz por caminhos ingremes ou planos, sem olhar para trás, rumo ao que será!

Assim, vamos marcando o ritmo por acontecimentos marcantes como o Natal e o Ano novo, os aniversários e as férias, que são paragens para desacelerar da vertiginosa corrida do dia a dia.

Não prestamos atenção ao trevo que desponta da terra, à tarde que lentamente se transforma em noite ou às ondas que se quebram nas rochas.

Não prestamos atenção a quem precisa de uma palavra, de um sorriso, ou mesmo de um naco de pão.

Não prestamos atenção ao sem abrigo que nos implora por alguma forma de ajuda, porque seguir indiferente é mais fácil.

Deixamos para o Natal as dádivas de esperança e o amor como legado, como se esses não fossem presentes de todos os dias.

E só em dias especiais, partilhamos as auroras resplandecentes de luz, como se essa poupança fosse um ganho e não uma perda.

Vamos tentar alcançar o horizonte com o nosso vasto olhar e não ficarmos indiferentes ao que vemos.

Teremos assim a possibilidade de criar boas memórias para gerações vindouras, porque só o tempo da memória pode parar e perdurar até tempos longínquos, em que instantes se eternizam.

Mas o tempo é finito, e mesmo olhando para trás ele segue em frente!

Festas Felizes

(Manuela Resendes)